sábado, 1 de agosto de 2015

CATECISMO DA SANTA MISSA PARA O RITO ROMANO TRADICIONAL

1 - O que é o Rito Romano tradicional?
Apesar de ser única, a Liturgia da Igreja pode ser celebrada em diversos ritos, como o Rito Romano, Bizantino, Maronita, etc. Mudam as cerimônias, mas o ato litúrgico é o mesmo.
No Rito Romano, a celebração da Missa recebeu suas primeiras formas já na época de São Pedro, Bispo de Roma e primeiro Papa, desenvolvendo-se pelos séculos até atingir a sua estrutura fundamental durante o pontificado do Papa São Gregório Magno. A partir daí, todas as mudanças e acréscimos feitos no Rito da Missa serão secundários, porque a base do Rito Romano já estava estabelecida.

Em 1545, durante o Concílio de Trento, a Igreja quis unificar o Rito Romano, sujeito às particularidades de cada Diocese. Não se trata de “criar” um novo Missal, mas de eliminar as variações locais tomando por modelo o seu tipo exemplar (o Missal usado em Roma), para que o Rito fosse idêntico em todo o Ocidente. A unificação impediria que em certas localidades os protestantes falsificassem o Missal introduzindo heresias, como ocorrera então. Por esta razão, o Rito da Missa a partir desta unificação ficou conhecido como tridentino, isto é, “de Trento”, porque foi por ordem do Concílio de Trento que houve a sua revisão.
Entretanto, o Concílio tridentino apenas solicitou a reforma do Missal, mas foi dissolvido sem empreender tal tarefa. O verdadeiro responsável pela unificação foi o Papa São Pio V, o qual a conclui em 1570. A partir daí costuma-se dizer que a Missa obedece o “Rito de São Pio V”.
Outros acréscimos foram feitos ao Missal tridentino desde então, mas sem alterar a estrutura fundamental do Rito Romano, que permanece a mesma desde São Gregório. As mudanças mais substanciais só acontecerão após o Concílio Vaticano II (1962-1965), quando a Igreja solicitou uma Reforma na Liturgia. Já em 1965, com o fim do Concílio, o Rito Romano sofre várias modificações, que simplificam, mas também inovam. Depois, em 1969, durante o pontificado do Papa Paulo VI, um novo Rito é promulgado, chamado de Novo Ordinário da Missa, que o grande liturgista Monsenhor Klaus Gamber prefere chamar de Ritus Modernus.
Sobre o costume de chamar o Rito pré-conciliar de “Rito tridentino” ou de “Rito de São Pio V”, convém lembrar que estes nomes são menos adequados. Os liturgistas preferem chamá-lo de Rito Romano tradicional ou então de Rito Gregoriano, porque a codificação do Missal por parte do Papa São Pio V é apenas uma fase de um Rito que já estava estruturado desde o Papa São Gregório. Ainda que várias mudanças tenham sido feitas ao longo dos séculos, elas não afetam os fundamentos do Rito Romano, pois somente com a promulgação do Novo Rito da Missa, em 1969, que ocorreram alterações verdadeiramente substanciais no Ordinário da Missa. Isso quer dizer que o Rito Gregoriano é o resultado do desenvolvimento da Liturgia no Ocidente.
2 - O que é a Missa?
Deus criou o homem para a glória do Céu, fazendo-o conviva da felicidade divina por um ato de exclusiva bondade, visto que criatura alguma mereceria tal prêmio. Mas o homem não só é indigno do Céu, como também incapaz de atingi-lo por suas próprias forças. É necessário um auxílio divino, a graça santificante, que é a presença de Deus na alma do homem, quando Deus mesmo faz morada em suas criaturas, unindo-se a elas pelo amor. E justamente porque mora no homem, tornando-se a vida da sua alma, Deus dá valor sobrenatural para os seus atos, tornando-os meritórios, isto é, dignos do prêmio da Vida Eterna.
Entretanto, ao cair em pecado, Adão frustra a sua salvação, e expulsa de si a presença de Deus pela graça, merecendo agora a condenação eterna. Não obstante essa perda, o pecado de Adão também causou uma profunda desordem de natureza, porque a malícia da sua ofensa tornou-o afeiçoado pelo pecado, de modo que a sua inteligência ficou afetada em ignorância (dificuldade em conhecer a verdade), e a sua vontade inclinou-se para o mal (a concupiscência). Em razão desses efeitos que a primeira transgressão é chamada de pecado original, porque Adão não só pecou, como também transmitiu o estado da sua natureza decaída a todos os seus descendentes. Desse modo, todo o homem nasce sob as consequências do pecado original, como diz o salmista: “eis que nasci na culpa, e minha mãe concebeu-me no pecado” (Sl. 50, 7).
Por uma questão de justiça, o pecado precisaria ser reparado, porque é uma ofensa a Deus. Mas toda a ofensa é proporcional à pessoa ofendida, isto é, o peso e o valor da ofensa se medem pela pessoa a quem se ofendeu. Deste modo, se Deus é infinitamente bom e digno de ser amado, uma ofensa a Deus só pode ter valor infinito, isto é, uma gravidade e malícia ilimitada. E já que o pecado exige reparação, somente uma obra que tenha mérito infinito seria capaz de satisfazer a ofensa infinita cometida contra a majestade divina. Sendo assim, nenhum homem ou outra criatura poderá reparar a injustiça do pecado, porque as criaturas são seres limitados, e por isso mesmo incapazes de oferecer uma obra cujo mérito seja infinito. A criatura, ao ofender a Deus, comete injustiça infinita, enquanto que, ao reparar, suas obras não alcançam a infinita justiça devida a Deus.
Impossibilitado de reparar a ofensa que cometeu, de que modo o homem irá se salvar? Deus, vendo a condenação que recaía sobre a humanidade e desejando que toda a justiça se cumprisse, por misericórdia envia Seu Filho, Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, a fim de que Ele realizasse a obra da redenção. Com efeito, o Filho é Deus com o Pai e o Espírito Santo, e por isso qualquer obra Sua teria valor infinito. Mas como foi o homem aquele que ofendeu, também deve ser homem aquele que irá reparar; e para isso o Filho se encarna, assumindo a natureza humana sem perder a Sua natureza divina, sendo uma só Pessoa com duas naturezas. Por ser homem, Jesus Cristo paga pelos pecados em nome de toda a humanidade. Por ser Deus, Sua obra redentora possui mérito infinito, capaz de reparar a infinita injustiça das transgressões humanas.
Assim, quando Cristo morre na Cruz, Ele realiza um verdadeiro sacrifício, porque oferece todo o Seu Ser como ato de adoração, louvor, ação de graças e reparação à Trindade Santíssima. Nosso Senhor entrega a Sua Vida no Calvário como Oferta agradável a Deus, a fim de reparar a infinita injustiça do pecado. Jesus realiza verdadeiramente a Redenção do homem, oferecendo um culto infinitamente digno a Deus pelo sacrifício da Sua própria Vida, ato sublime de Amor. Importa notar aqui que Deus poderia condenar pura e simplesmente o homem pelo seu pecado, ou poderia aceitar uma reparação cabível às forças do homem, como os sacrifícios do Antigo Testamento, por exemplo. Entretanto, dando o Seu Filho único como Cordeiro imolado, a Sabedoria divina escolheu o meio que mais cumpre a justiça (preferindo a reparação rigorosa e perfeita) e mais expressa a misericórdia (aceitando que Seu Filho repare os pecados consumindo a Si mesmo por Amor).
Mas a morte de Jesus no Calvário não bastou para realizar a salvação. Faz-se necessário um meio para que os efeitos da Redenção fossem aplicados nos homens. Por esta razão, Cristo deixou para a Igreja os Sacramentos, que são os canais por onde são aplicados os frutos da Redenção, através das graças sacramentais, operando assim a recuperação da vida divina na alma.
O primeiro Sacramento é o Batismo, porque sem ele nenhum outro Sacramento tem efeito. Ele nos infunde a graça santificante, a qual Adão perdeu para si e para todos os seus descendentes. Por ela, novamente o homem é capaz de merecer o Céu, tornando-se então filho adotivo de Deus e membro do Corpo Místico de Cristo, a Igreja. A graça santificante anula a herança do pecado original que há em todo o homem, apesar de ainda permanecer na natureza humana uma inclinação para o mal (a concupiscência) que é vencida gradualmente com o auxílio divino lucrado na penitência e pela vida de oração.
Mas caso o homem volte a se separar de Deus cometendo um pecado mortal, o Sacramento da Penitência tem por efeito recuperar a vida da graça, através da absolvição sacramental. Os pecados veniais não separam o homem de Deus, mas apenas lhe diminuem o amor, ao passo que os pecados mortais rompem completamente com a amizade divina, expulsando a graça da alma (cf. Sab. 1, 4-5).
Ao instituir os Sacramentos, Cristo também considerou a fraqueza humana, e quis dar um Sacramento que servisse de alimento espiritual, para fortalecer o homem na prática da virtude. Assim, a Eucaristia é o maior de todos os Sacramentos, porque não apenas concede uma graça, como também é a presença real de Jesus Cristo sob as aparências do pão e do vinho. Quando o sacerdote consagra, o pão e o vinho mudam-se em Corpo e Sangue de Cristo, mantendo porém as suas espécies, porque continuam se comportando como pão e vinho mesmo após a Consagração. Portanto, a presença de Jesus na Eucaristia é real, mas invisível e imperceptível.
Como se vê, os Sacramentos transmitem as graças necessárias para que o homem recupere a vida da alma e alcance a salvação. Entretanto, eles nos fazem participar apenas dos frutos da Redenção, enquanto que Nosso Senhor quer nos unir ao próprio Sacrifício da Cruz. Mas de que modo esta união e participação será possível, se Sua morte no Calvário ocorreu há tantos séculos? Como a humanidade poderá se unir ao Sacrifício do Filho de Deus, se só tão poucos puderam estar presentes ao pé da Cruz? E de que maneira Jesus quer nos unir em participação à Sua Oferta, se apenas Ele é capaz de expiar os pecados do mundo?
O Sacrifício de Jesus no Calvário é único e suficiente, pois o mérito de Sua morte é infinito, capaz de reparar os pecados de toda a humanidade. No entanto, Jesus quer unir os homens ao Seu Sacrifício, a fim de que participem do supremo culto de adoração, louvor, ação de graças, reparação e impetração que Ele prestou à Trindade Santíssima ao Se entregar na Cruz. Deve haver, portanto, um meio pelo qual Cristo une os homens ao Seu Sacrifício sem que se repita a Sua Paixão; e para isso Ele instituiu a Santa Missa.
Com efeito, o Catecismo da Doutrina Cristã ensina que a Santa Missa é o “sacrifício incruento do Corpo e do Sangue de Jesus Cristo, oferecido sobre os nossos altares, debaixo das espécies de pão e vinho, em memória do Sacrifício da Cruz”. A Missa é Sacrifício porque atualiza no altar a Oferta de Cristo na Cruz, isto é, o mesmo Sacrifício do Calvário é posto presente no tempo e no espaço pela celebração da Santa Missa. Não significa que Jesus morra novamente durante a Missa, ou que a sua celebração seja apenas uma “lembrança” do Sacrifício da Cruz. A Missa é realmente o mesmo Sacrifício do Calvário, pois Jesus reapresenta a Sua Oferta à Trindade Santíssima sem morrer uma segunda vez. Um só é o Sacrifício de Jesus Cristo, mas que se torna presente no tempo e no espaço a cada Missa celebrada.
E por que razão a Santa Missa é exatamente o Sacrifício da Cruz? Porque idêntica é a Oferta e o Oferente. Na Cruz, Jesus foi Sacerdote porque fez um Oferecimento, e foi Vítima porque fez de Si mesmo a Oferta. Na Missa, Jesus continua Sacerdote, porque realiza o Oferecimento através do celebrante, ao agir nele. Por esta razão, a Igreja ensina que o sacerdote age in Persona Christi, isto é, “na Pessoa de Cristo”, porque empresta a sua voz e seus atos para que o próprio Cristo consagre e ofereça o culto. Por último, na Missa Jesus continua Vítima, porque oferece a Si mesmo no pão e no vinho mudados em Seu Corpo e Sangue. O Sacrifício da Cruz foi a Oferta total de Jesus à Trindade Santíssima, de Seu Corpo e Sangue, Alma e Divindade. Na Missa, Jesus também Se oferece tal como na Cruz, mas por meio das espécies eucarísticas.
Na Cruz, Jesus entregou-Se até a morte, quando o Seu Sangue se esgotou e se separou do Seu Corpo. Na Missa, o celebrante consagra o pão, tornando-o o Corpo, e depois consagra o vinho, tornando-o o Sangue do Senhor. Portanto, assim como a separação do sangue e do corpo produz a morte corporal, a Consagração separada do Corpo e do Sangue do Senhor atualiza verdadeiramente o Sacrifício da Cruz, porque Jesus é posto no altar sob o estado de Vítima. Neste sentido, não há diferença entre a Cruz e a Missa, porque idêntica é a Oferta e o Oferente, é o mesmo Jesus que Se oferece e é oferecido.
Contudo, quando a Missa atualiza no altar o Sacrifício da Cruz, ela o faz de modo místico e incruento. É uma renovação mística do Calvário porque Jesus se oferece sacramentalmente no altar, ou seja, através do Sacramento do Seu Corpo e Sangue. A consagração torna o pão e o vinho em Corpo e Sangue do Senhor, mas as aparências de pão e vinho permanecem. Neste sentido, a Missa atualiza verdadeiramente o Sacrifício do Calvário, mas ocultando a Oferta e o Oferente debaixo de símbolos e gestos que evocam a Cruz. Mesmo que o Sacrifício de Cristo seja renovado na Missa de forma invisível, por meio do Sacramento do Seu Corpo e Sangue, ainda assim a Missa não é um mero “símbolo” ou “memorial” da Cruz. A Missa é realmente idêntica ao Sacrifício do Calvário, ainda que exteriormente vejamos apenas os ritos da Liturgia.
Por último, dizemos que a Missa é Sacrifício incruento porque é o mesmo Sacrifício do Calvário renovado de forma indolor e não-sangrenta, de modo que a Oferta de Jesus à Trindade Santíssima não preserva as dores de Sua Paixão quando é atualizada no altar. Isso porque Cristo está glorioso no Céu, e não pode mais sofrer nenhum padecimento. Portanto, se a Missa renova misticamente o Sacrifício do Calvário é porque Jesus torna presente a Sua Oferta através do Sacramento do Seu Corpo e Sangue, por meio do sacerdote celebrante, e sem as dores da Cruz.
A Missa é verdadeiramente a renovação do Sacrifício do Calvário, e quando a instituiu, Jesus mostrou a relação essencial que há entre a Cruz e a Missa. Com efeito, durante a Última Ceia, o Senhor pronunciou as seguintes palavras sobre o pão: “Isto é o meu Corpo, que é dado por vós” (Lc. 22, 19). Nesta fórmula, Cristo declarou que o pão tornou-se o Seu Corpo, e que este Corpo é entregue em favor deles, tal qual Ele se entregaria a Si mesmo em Sacrifício na Cruz. Assim se vê que a relação de identidade entre a Missa e o Sacrifício do Calvário. Enganam-se, porém, os que pensam que a Missa seja uma “ceia”, pois Jesus instituiu a Missa ao fim a ceia a fim de que fosse o Sacrifício da Nova Aliança (depois de ter cumprido com os discípulos os ritos da Páscoa judaica, Ele celebra sacramentalmente o Sacrifício que substitui a Velha Aliança). Com efeito, a Eucaristia enquanto celebrada é Sacrifício (Santa Missa), ao passo que a Eucaristia enquanto recebida é Ceia (Comunhão), porque Jesus faz do Seu Corpo e Sangue banquete espiritual da alma. Da mesma maneira, se dizemos que a Missa é Sacrifício “em memória do Sacrifício da Cruz”, não é porque se trata de uma “lembrança” da Paixão do Senhor. Pelo contrário: é no sentido de que torna presente o mesmo Oferecimento do Calvário, de modo que um só é o Sacrifício de Cristo, mas dois são os modos como ele é oferecido: cruento (sangrento) na Cruz, e incruento na Missa (cf. Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, questão 280).
3 - Quais são os fins da Missa?
Nosso Senhor Jesus Cristo instituiu a Missa para nos unir moralmente ao Seu Sacrifício na Cruz, a fim de que por ela participemos da Sua infinita homenagem à Trindade Santíssima. Assim, sendo renovação do Sacrifício do Calvário, toda a Missa é um culto: 1) latrêutico (adoração), 2) eucarístico (ação de graças), 3) propiciatório (reparação e satisfação dos pecados), 4) impetratório (de petição de benefícios). Quando participamos da Missa, nos unimos a Cristo em Seu Sacrifício, de modo que tomamos parte deste Oferecimento, fazendo do Seu culto o nosso culto. Neste sentido, não há oração maior do que a Santa Missa, porque ela é a Oferta agradabilíssima de Jesus Cristo à Trindade Santíssima, à qual toda a Igreja se une para com Ele, nEle e por Ele prestar o devido culto a Deus. O amor infinito de Cristo pela humanidade não só O impeliu a oferecer-Se no Calvário, como também a multiplicar este Oferecimento a cada Missa celebrada, para que todos os homens participem de Sua homenagem à Trindade Santíssima. Dizia São João da Cruz que “amor só se paga com amor”, e o único modo de pagar o imenso ato de amor que é a Missa é frequentando-a sempre, fazendo todo o sacrifício para assistir o maior número de Missas possível, porque a cada Missa celebrada Jesus morre misticamente no altar pelos homens.
4 - A quem se oferece a Missa?
A Missa é oferecida apenas a Deus, porque é o supremo culto que Jesus, Deus e Homem verdadeiro, prestou à Trindade Santíssima. Quando porém dizemos que uma Missa foi oferecida a algum Anjo ou Santo, é no sentido de que honramos a Deus por eles, ou então porque pedimos que eles se associem a nós durante aquela Liturgia.
5 - Por quem se oferece a Missa?
A Missa se oferece em benefício de todo o Corpo Místico de Cristo como também de toda a humanidade porque: 1) honra os Santos, que vivem na glória de Deus, 2) alivia as almas do Purgatório, 3) beneficia todos os fiéis vivos, 4) atinge inclusive os homens que vivem fora do grêmio da Igreja católica.
O benefício dos vivos e defuntos, porém, é relativo, porque depende do grau de disposição de cada um. As almas do Purgatório só podem receber das graças da Missa de acordo com o grau de amor que possuíram por Deus na terra, de modo que uma alma tíbia pouco receberá em morte. Isso porque depois da morte o tempo de merecimento acabou, e a alma já não pode mais acrescentar méritos para a sua salvação. Sendo assim, os fiéis defuntos recebem proporcionalmente à disposição de alma que tinham durante a vida. Há também de se considerar que a aplicação das graças aos fiéis defuntos depende da vontade de Deus, que pode querer que uma alma fique mais ou menos tempo no Purgatório. Daí a importância de se oferecer várias vezes a Missa por uma alma.
Os fiéis vivos também recebem desigualmente as graças da Missa. Há três classes de benefícios: 1) pelo sacerdote celebrante, 2) pelos fiéis presentes (a começar por aqueles que ajudaram na celebração de alguma maneira), 3) pelos fiéis em geral. O benefício depende da disposição interior, e do real desejo de participar daquela Missa, de modo que quanto maiores forem a contrição, a fé e a caridade, mais frutífera será a participação. Desse modo, ainda que a Missa seja oferecida também por toda a humanidade, seus frutos só beneficiam quem possui intenção reta. Mesmo que uma só Missa seja capaz de converter a humanidade inteira, Deus, que é justo, só pode aplicar os frutos do Sacrifício eucarístico, ordinariamente falando, aos que tem a devida disposição de coração.
6 - Quem pode assistir a Missa e comungar?
Somente um católico batizado pode assistir a Missa por inteiro—ainda que não seja ilícita a presença um não-católico—, principalmente a sua parte sacratíssima, a Consagração. Para isso, a Igreja dividiu o Rito da Missa em duas partes: Missa dos catecúmenos e Missa dos fiéis. A primeira parte está voltada para aqueles que se preparavam para o Batismo (os catecúmenos), e que por isso mesmo não podiam assistir as partes mais sagradas da celebração. Na Missa dos catecúmenos, que vai do início até o Credo, dá-se toda a parte catequética do Rito, porque expõe a Fé católica através de leituras, salmos e o Credo. A segunda parte, por sua vez, é dedicada aos batizados, aos quais se expunha os Santos Mistérios da Religião. Na Missa dos fiéis, que vai do Ofertório até os ritos finais, ocorre a parte sacramental do Rito, cujo centro é a Consagração, seguido da Comunhão.
A Comunhão só é dada aos católicos batizados, que não estão impedidos de pecado mortal, cisma, heresia ou excomunhão. Neste sentido, só pode comungar quem está em estado de graça, isto é, em união com a Igreja e livre de todo o pecado mortal. Para isso, é necessário que o católico examine constantemente a consciência, a fim jamais se aproximar da Eucaristia sem antes ter recebido o perdão dos pecados mortais na Confissão sacramental. Com efeito, o pecado mortal é uma ofensa grave a Deus, quando a matéria do pecado é grave, há plena advertência e pleno consentimento de cometê-lo. Todos os pecados contra os Mandamentos são graves: não amar a Deus sobre todas as coisas, faltar à Missa em dias de preceito, odiar o próximo, mentir com intenção de enganar ou prejudicar, embriaguez (quando é completa), adultério, os pecados contra a castidade (o desejo do prazer ou da vida sexual fora do matrimônio), roubo (quando há grande prejuízo do próximo), etc. Só se obtém o perdão dos pecados mortais pelo Sacramento da Penitência, porque ele recupera a vida da graça perdida e rompida pela ofensa grave. Mas também é possível recuperar a graça quando se faz um ato de contrição perfeita unido ao desejo de se confessar na oportunidade mais próxima. Ainda assim, o penitente não pode se aproximar da Comunhão enquanto não consumar a sua Confissão.
Há quem diga que Jesus veio curar as almas doentias, e por isso todos os pecadores podem comungar sem necessidade da Confissão sacramental. No entanto, a Confissão é justamente o meio da cura, e não só seria errado como também grave sacrilégio comungar em estado de pecado mortal. Com efeito, a Eucaristia é o Sacramento do Amor, porque nele Jesus Se faz alimento das almas para a sua santificação e salvação, e por isso só se aproximam desse Sacramento quem não rompeu com o amor a Deus, Ele que vive em nós pela graça. Os pecados veniais, por sua vez, porque apenas diminuem o amor a Deus sem perdê-Lo, não impedem de comungar, ao contrário dos mortais, que exigem antes a Confissão sacramental. Recomenda-se confessar-se pelo menos a cada mês (ou o mais frequente possível), porque a Confissão não só perdoa os pecados confessados (mortais ou veniais), como também dá as graças necessárias para evitar os pecados futuros. Na dúvida se um pecado é venial ou mortal, um método de exame de consciência de devocionários, manuais ou catecismo de doutrina podem esclarecer, mas a dúvida pode ser declarada ao confessor. No entanto, aquele que cometeu um pecado mortal, mas sem consciência, está isento de culpa, devendo ainda assim confessá-lo, explicando a circunstância ao confessor. Que os católicos nunca esqueçam do tremendo privilégio que é comungar o Corpo do Senhor, e para isso procurem fazê-lo com a consciência limpa, a fim não atraírem para si a condenação e a morte eterna.
Por último, também não podem comungar quem está separado da Igreja por cisma (desobediência à autoridade do Papa), heresia (negação de uma ou mais verdades de Fé) ou excomunhão (a expulsão da Igreja por algum erro ou pecado que mereça tal punição). Caem em excomunhão os católicos que: 1) praticam ou favorecem o aborto, 2) filiam-se, votam ou participam de Partidos socialistas ou comunistas. A filiação em sociedades secretas (como Maçonaria, Rosa Cruz, etc), outrora punida com a excomunhão, atualmente não passa de pecado mortal.
A Igreja também estipula o jejum eucarístico, como sinal de respeito à presença real de Jesus no Sacramento do altar. A regra atual para o jejum é de uma hora sem alimento sólido até o momento da Comunhão, permitindo-se água a qualquer instante.
7 - Como se deve comungar?
A Igreja, desde muitos séculos, exige que a Comunhão seja dada exclusivamente na boca, com o comungante de joelhos. A Comunhão na boca visa: 1) afirmar a superioridade do sacerdote sobre os fiéis, pois ele é quem possui as mãos consagradas para distribuir o preciosíssimo dom da Eucaristia, 2) evitar que fragmentos da Hóstia fiquem presos na mão do comungante, como também caiam eventualmente no chão durante a distribuição, 3) recordar que a Eucaristia vem da Igreja, e portanto não é conveniente que os fiéis comunguem por si mesmos, mas pelas mãos do ministro competente, que é o sacerdote. O ato de ajoelhar-se, por sua vez, expressa: 1) a adoração necessária para com a Eucaristia, por ser presença real de Jesus sob as aparências de pão, 2) a reparação que os fiéis devem a Nosso Senhor, quando os soldados O ofendiam ajoelhando-se diante dEle, para zombá-Lo de se dizer Rei dos judeus.
As vantagens da Comunhão de joelhos e na boca são inquestionáveis, mas desde a década de 60, na Holanda, a prática da Comunhão na mão disseminou-se sem autorização da Igreja. Até então, a Comunhão na mão só estava permitida em caso de necessidade, quando o sacerdote não tinha condições de distribui-La a todos os comungantes, como durante uma guerra. Por esta razão, o Papa Paulo VI mandou perguntar aos Bispos do mundo todo se eles aceitariam a Comunhão na mão. A maioria absoluta dos Bispos negou. Por conseguinte, o Papa ordena que a Comunhão continuasse a ser distribuída como sempre. Apenas foi dada autorização para a Comunhão na mão nos países onde ela já estava estabelecida, mas sob a condição de exceção.
Rapidamente, porém, a Comunhão na mão se espalhou pelo mundo todo, contra a vontade do Papa. Os resultados desta prática abusiva já haviam sido previstos por Paulo VI: a diminuição na Fé em Jesus eucarístico, justamente porque eliminaram-se todos os sinais de adoração que a Comunhão de joelhos e na boca possuem. Muitos sacerdotes movidos por uma teologia alheia à doutrina católica usaram da Comunhão na mão para ensinar que a Eucaristia é um “mero símbolo” (qualquer um pode pegá-la nas mãos), e que o sacerdote não é superior ao povo (qualquer um pode subir ao altar e se servir da Eucaristia sem o celebrante). Daí se vê a gravidade desta prática.
Diante desta lamentável crise de Fé na presença real de Jesus na Eucaristia, o Papa Bento XVI, desde a festa de Corpus Christi de 2008, começou a distribuir a Comunhão da forma tradicional: de joelhos e na boca. Já se aguarda que no futuro a Comunhão na mão será novamente proibida, porque a sua liberação não trouxe bons resultados.
No Rito Gregoriano, a Comunhão só pode ser recebida na boca e de joelhos. Por motivos de saúde, quem não pode se ajoelhar recebe-a de pé; nunca, porém, na mão. No Rito Reformado, por sua vez, é possível as duas formas. Contudo, muitos sacerdotes, movidos por falsos preconceitos, proíbem os fiéis de comungarem na boca e de joelhos. Na verdade, eles não têm poder para proibir, visto que a Comunhão na boca ou de joelhos é um direito inalienável dos fiéis, e nem mesmo um motivo de saúde pública pode obrigar os fiéis a comungarem na mão—como afirmou, em 2009, a Congregação para o Culto Divino. Ademais, a Ciência concorda que a Comunhão na boca é mais higiênica, porque envolve apenas a mão do celebrante, que foi lavada antes e durante a Missa, bastando a ele que apenas “lance” a partícula na língua do comungante sem risco de tocá-la—o que será mais fácil ainda se o fiel estiver de joelhos.
8 - Assistir à Missa é uma obrigação?
A Igreja obriga os católicos a assistirem à Missa em determinados dias, considerados de preceito, sob pena de pecado mortal. Isso porque a Igreja é Mãe e Mestra, e tem poder de determinar sobre seus filhos as circunstâncias para o cumprimento dos mandamentos, a fim de cuidar da sua salvação. Com efeito, quem faltou à Missa em dia de preceito pecou porque desobedeceu a Igreja, manifestando assim um grande descaso pela salvação da própria alma.
Os dias de preceito são todos os domingos do ano, mas atualmente Missa vespertina de sábado cumpre o preceito. Também são de preceito as festas de: Maria Mãe de Deus (1/1), Epifania (6/1), Ascensão, Corpus Christi, Assunção de Nossa Senhora (15/8), Todos os Santos (1/11), Imaculada Conceição (8/12) e Natal (25/12). No Brasil é permitido a transferência das festas da Epifania, Ascensão, Assunção e Todos os Santos para o domingo seguinte. Estão dispensados do preceito aqueles que moram muito longe da igreja, sem possibilidade de se deslocar até ela, os doentes, e os que são obrigados a trabalhar no dia para o próprio sustento. Nos domingos e dias santos é pecado não só faltar à Missa, como também ocupar-se em trabalhos manuais e forçosos desnecessários, que impedem a santificação deste dia.
Outra ocasião de dispensa para a Missa é quando a celebração constitui perigo para a fé, porque favorece o escândalo, a heresia ou profanação. Neste sentido, se o celebrante reza a Missa adulterando as orações do Missal, a fim de mudar-lhes o sentido, ensina doutrinas contrárias à Igreja, não dá a devida reverência ao Santíssimo Sacramento, permite músicas inadequadas, insere teatros, apresentações ou outras comemorações inapropriadas, o fiel tem o direito de não frequentar tais celebrações, porque ameaçam a integridade de sua fé e impedem a sua santificação.
Contra o preceito de assistir à Missa, alguns alegam que só a assistem “quando tem vontade”. Mas uma alma doente, que descuida da própria salvação, certamente não terá vontade de assistir à Missa, tanto quanto um doente recusa os alimentos porque não tem fome ou não sente o sabor. Todo católico deve lutar contra os seus defeitos para cumprir devotamente as suas obrigações religiosas, e não se deixar vencer pela preguiça, pelo desleixo e pelo relaxo, porque não há nada mais necessário no mundo do que a salvação da alma.
9 - De que modo se participa da Missa?
A Missa é a renovação mística e incruenta do Sacrifício da Cruz, no qual Jesus ofereceu à Santíssima Trindade um culto de adoração, louvor, ação de graças, reparação e satisfação dos pecados. Se Nosso Senhor quis instituir a Santa Missa é para que os homens participem do Seu Sacrifício, isto é, que se unam a Ele a fim de tomarem para si a infinita homenagem de Cristo. Pela Missa o homem participa da Cruz, porque toma parte no culto de Jesus oferecido no Calvário, de modo que por Ele, com Ele e nEle é dado digno culto a Deus.
Participar da Missa é oferecer Jesus no altar, fazendo do Seu Sacrifício o sacrifício de cada assistente da celebração. Um só é o que sacrifica, isto é, aquele que age em nome de Cristo (o celebrante), mas muitos são os que oferecem a Missa (os assistentes), porque se unem ao sacerdote fazendo daquele Sacrifício uma homenagem pessoal a Deus. Nenhuma criatura pode oferecer um culto digno de Deus, porque os louvores das criaturas são insuficientes perante a infinita majestade do Criador. Entretanto, pela Missa o homem se une a Jesus nas intenções de adoração, louvor, ação de graças, reparação e satisfação dos pecados pelas quais Ele Se ofereceu na Cruz.
Neste sentido, é necessário fazer uma distinção entre “participar da Missa” e “participar do Rito”. Com efeito, participar da Missa é a unir-se em intenções com Jesus no Seu divino Sacrifício, para lucrar da Sua infinita homenagem à Trindade Santíssima. Participar do Rito, por sua vez, é segui-lo como meio de união com a Missa. O Rito são as cerimônias pelas quais se celebra a Missa, e acompanhá-lo é um meio de atingir a união com o Sacrifício do altar. Deste modo, participar das cerimônias não significa participar da Missa. Para participar da Missa, não basta cantar, responder as orações e fazer gestos; estes atos só fazem sentido quando estão unidos a um desejo interior de participar da Missa.
Quem foi a uma Missa sem conhecer o seu Rito—porque foi rezado em uma língua diferente ou por se tratar de outro Rito—nem por isso perdeu de participar da celebração. Não é necessário acompanhar as cerimônias para participar da Missa, basta a intenção. Neste sentido, há quem prefira participar da Missa através de métodos particulares, rezando o Rosário, a Via-Sacra, fazendo leituras e meditações piedosas ou outras orações durante a celebração. Não se trata de “rezar durante a Missa”, mas de oferecer orações que suscitem as intenções necessárias para participar da Missa. Deste modo, a Missa é participada tanto por quem acompanhou as cerimônias quanto por quem rezou em particular: o essencial é unir-se em intenções com Nosso Senhor, porque para participar do Seu divino Sacrifício que se renova no altar é preciso também ter os mesmos desejos de adoração, louvor, ação de graças, reparação e satisfação pelos pecados que O levaram a Se oferecer na Cruz.

Eis o meio mais adequado para assistir com fruto à Santa Missa: consiste em irdes à Igreja como se fôsseis ao Calvário, e de vos comportardes, diante do altar, como o faríeis diante do trono de Deus, em companhia dos Santos Anjos. Vede, por conseguinte, que modéstia, que respeito, que recolhimento são necessários para receber o fruto e as graças que Deus costuma conceder àqueles que honram, com sua piedosa atitude, mistérios tão santos.” (São Leonardo de Porto-Maurício. As excelências da Santa Missa)

10 - De que modo deve ser a atitude de quem assiste à Missa?

Ora, dizei-me sinceramente se, quando ides à igreja para assistir a Santa Missa, pensásseis bem que ides ao Calvário assistir à morte do Redentor, que diria alguém que vos visse ai chegar numa atitude tão pouco modesta? Se Maria Madalena fosse ao Calvário e se prostrasse aos pés da Cruz vestida, perfumada e ataviada como em seus tempos de desordem, quanto não seria censurada! E que se dirá de vós que ides à Santa Missa como se fôsseis a uma festa mundana?
Que aconteceria, sobretudo se profanásseis este ato tão santo, com gestos, risadas, cochichos, encontros sacrílegos?
Digo que, em qualquer tempo e lugar, a iniquidade não tem cabimento; mas os pecados que se cometem na hora da Santa Missa e na proximidade do altar, são pecados que atraem a maldição, de Deus: Maldito o que faz a obra do Senhor com má fé (Jer. 48,10). Meditai seriamente sobre esse assunto.” (São Leonardo de Porto-Maurício. As excelências da Santa Missa)

Diante do tremendo Sacrifício da Santa Missa, como ensina São Leonardo, os fiéis devem possuir uma atitude devota, respeitosa e modesta, ciente de que é Jesus que se oferece misticamente no altar por toda a humanidade. Assim diz uma oportuna oração do Rito Bizantino: “Ninguém que se deixa dominar pelas paixões e pelas inclinações do corpo é digno de se aproximar e se apresentar diante de Vós para Vos render culto, porque Vos servir, ó Rei de imensa glória, é uma ação grandiosa e atemorizante mesmo para os poderes celestes.
Neste sentido, para uma participação frutífera da Missa, os fiéis devem vestir-se com modéstia e decência. É completamente incabível usar bermudas, regatas, roupas curtas, apertadas, decotadas, transparentes, com dizeres ou estampas mundanas, que distraem e escandalizam os demais fiéis, sendo causa de condenação para que as usa. O cuidado das roupas indica que Deus é o centro da Liturgia, e nada deve desviar-se dEle. Esta questão é tão necessária que desde o tempo dos apóstolos era costume que as mulheres usem um véu sobre a cabeça, como símbolo de submissão, humildade e espírito de oração. O véu, apesar de ter caído no desuso, nunca foi abolido, e é um importante sinal da presença do sagrado, que precisa ser recuperado pelas gerações de hoje.
Durante a Santa Missa, não se pode ler jornais ou similares, conversar, atender ao celular dentro da igreja, comer ou prender a atenção a qualquer outra atividade que distrai da Liturgia, sob risco de pecar contra o primeiro mandamento. Também é escandaloso que casais troquem sinais de afeto durante a Missa (abraços, beijos), por não ser o momento e nem o local adequados.
11 - Em que língua é rezada a Missa?
Inicialmente, era rezada em aramaico e grego, línguas faladas nas regiões onde habitavam os primeiros cristãos. No Rito Latino, o latim foi aos poucos incorporado à Liturgia, até tornar-se a sua língua oficial. Com efeito, desde muitos séculos a Missa do Rito Romano é rezada em latim, excetuando-se o sermão, sempre feito em língua vernácula (a língua do povo). A Reforma Litúrgica do Concílio Vaticano II, por sua vez, desejou aumentar o uso do vernáculo nas celebrações, sendo que em 1965 permitiu-se a língua vernácula em diversas partes da Missa. A partir de 1969, com a promulgação do Novo Ordinário da Missa, toda a Liturgia pode ser celebrada na língua do povo.
Mesmo autorizando o uso da língua vernácula, o latim continua sendo a língua oficial do Rito Latino, de modo que: 1) nunca é ilícito celebrar Missa em latim, 2) o vernáculo é uma exceção permitida, 3) seu alcance é limitado e depende da autorização prévia da Igreja. Sempre foi do reconhecimento da Igreja as vantagens do latim para a preservação da sacralidade na Liturgia:
  1. O latim é uma língua separada para Deus, exclusiva para o culto, para mostrar que a Liturgia é uma ação sobrenatural, merecendo uma língua própria, diferente da língua vulgar. Com efeito, o latim é uma língua morta, isto é, não falada mais por nenhum povo, por ter caído no desuso. Ao escolher o latim como língua litúrgica, a Igreja quer mostrar que o culto está dirigido a Deus e não ao povo, e por isso usa-se uma língua que não seja a vulgar, diferenciando-se uma ação sagrada de um evento mundano. E devido à dignidade da Liturgia, pede-se uma língua mais nobre, para se expressar de modo inequívoco a Fé da Igreja.
  2. O latim preserva a Liturgia de falsas interpretações, impedindo que se dê sentido particular às orações da Igreja. Em latim, a Liturgia guarda apenas o sentido dado pela Igreja, evitando-se que a má compreensão dos textos litúrgicos gere falsas teologias. Mesmo as traduções autorizadas pela Igreja do Rito da Missa podem ser deturpadas. Deste modo, o latim obriga os fiéis a buscarem não só a tradução adequada como também o sentido exato da oração, de acordo com a Fé católica.
  3. As línguas vernáculas (como o português, espanhol, inglês, etc.) mudam com o passar do tempo, porque são línguas vivas, faladas por diversas nações. O português falado por Camões não é o mesmo de Machado de Assis, que também não é o mesmo falado hoje. Se a Liturgia for celebrada na língua vulgar, de tempos em tempos seriam necessárias traduções atualizadas e adaptadas, o que facilita em muito a falsificação do texto litúrgico, visto que os inimigos da Igreja teriam a oportunidade de divulgar uma tradução com erros teológicos. Do mesmo modo, as mudanças que as línguas vernáculas sofrem ao longo do tempo prejudicam a preservação do sentido das orações, quando algumas palavras caem no desuso e outras mudam de significado. O latim, sendo língua morta, não muda com o tempo, e preserva de modo inabalável as orações da Liturgia. Pelo latim, dedica-se a Cristo, Deus morto e ressuscitado, uma língua morta e ressuscitada pela Igreja para o culto divino.
  4. A Liturgia é o culto oficial da Igreja, pelo qual todos os cristãos rendem o mesmo louvor a Deus. Por conseguinte, o latim representa a unidade da Igreja e a unidade de culto, porque a unidade da língua litúrgica indica que é o mesmo culto apesar da diversidade dos povos e nações. Na torre de Babel, cada qual falava uma língua, e ninguém se entendia. Em Pentecostes, ao contrário, o Espírito Santo permitiu que todos se entendessem mesmo sem falar a mesma língua. O latim une a Igreja universal, de modo que a mesma Fé é professada de igual maneira ainda que muitos sejam os lugares, culturas, pessoas, etc.
  5. Na placa da Cruz de Cristo a Sua sentença foi escrita em latim, grego e hebraico. O Rito da Missa abrange estas três línguas, porque é rezado em latim, contendo também palavras em grego (Kyrie, Christe, eleison) e hebraico (Amen, Sabaoth, Hosanna). Com isso se quer simbolizar que a Missa é o mesmo Sacrifício do Calvário. Ademais, como tudo aquilo que Cristo tocava tornava-se santo, a língua que a Igreja usou durante séculos para a celebração dos divinos mistérios também tornou-se santificada pelo uso, de modo que o latim é uma língua sagrada, própria para a Liturgia. Outros povos também observaram a conveniência de haver uma língua sagrada, separada para o culto. Os judeus, por exemplo, falavam aramaico no quotidiano, mas usavam o hebraico no Templo. Os muçulmanos, por sua vez, usam do árabe, enquanto que os hindus, do sânscrito.
  6. Um ato tão sagrado quanto a Liturgia exige um cuidado zeloso e devoto, principalmente na Santa Missa, quando o próprio Jesus se torna presente no altar. Deste modo, deve-se preservar o culto divino livre de toda a blasfêmia, profanação ou sacrilégio. Para isso, o latim ocupa a função de guardar a Liturgia do alcance dos inimigos da Igreja, de modo que o uso de uma língua desconhecida evita que os blasfemadores ofendam as coisas santas, justamente porque não compreendem o seu significado. Jesus mesmo ensinou que não se deve dar pérolas aos porcos, isto é, as coisas santas àqueles que não sabem apreciá-las. Ele mesmo quando falava ao povo, dizia tudo em parábolas, revelando o seu significado somente aos apóstolos, para evitar que certas verdades mal compreendidas fossem causa de escândalo e condenação aos demais. Mesmo entre os fiéis, o uso de uma língua desconhecida indica que a Liturgia é ação misteriosa, porque Deus opera de forma prodigiosa e incompreensível no culto da Igreja. O latim é um convite à postura humilde e submissa, quando muitos se enchem de soberba porque julgam “entender” a Missa somente por conhecer as suas orações.
Perante tantos benefícios que o latim traz para o culto, a Igreja deseja a sua permanência enquanto língua oficial da Liturgia—ao menos no Rito Latino—, de modo que as línguas vernáculas jamais irão substituir ou abolir a língua latina. O latim, além de suas consideráveis vantagens, em nada impede que os fiéis tenham uma frutífera assistência da Missa—mesmo não entendendo a língua—, porque, como foi dito acima, a participação não depende do Rito ou da língua, mas da intenção. São os desejos da alma que garantirão a participação, e não o acompanhamento das cerimônias por si só.
12 - Onde é rezada a Santa Missa?
A sacralidade da Santa Missa exige que sua celebração seja feita com toda a dignidade, respeito e solenidade possível. Com efeito, não é cabível celebrar Missa em sedes de confissões religiosas, como igrejas ou colégios protestantes, centros espírita, bem como em sociedades acatólicas, a exemplo da Maçonaria, Rosa-Cruz, etc. A Santa Missa deve ser oferecida em igreja ou capela católica, e uma celebração campal só é lícita quando necessário. Apenas em tempos de guerra ou calamidade a Missa pode ser celebrada em ambientes precários ou impróprios, como florestas, casas particulares, depósitos, etc.
A Missa é oferecida obrigatoriamente sobre o altar, que é a parte mais alta da igreja. Desde muitos séculos os altares possuem um sepulcro, isto é, um pequeno espaço cavado em sua superfície, onde são depositadas as relíquias de dois santos, sendo um deles necessariamente mártir. Este costume recorda que, nos primeiros séculos, a Missa era celebrada nas catacumbas, sobre os túmulos dos santos martirizados. Se a Santa Missa é Jesus Se sacrificando misticamente pelos homens, o altar deve conter as relíquias de algum santo que se sacrificou por Cristo, isto é, o mártir.
Sobre o altar, o Rito Gregoriano exige três toalhas, o crucifixo e no mínimo duas velas. A Cruz recorda o Sacrifício do Calvário, que será atualizado durante a Santa Missa, enquanto que as velas simbolizam a doação, porque para a vela gerar luz e calor, ela precisa se consumir. É costume enfeitar o altar com flores, que representam os bons desejos de virtude que o homem deve oferecer a Deus. Em tempos de penitência, as flores são retiradas.
Desde os tempos primitivos, a Santa Missa era rezada com o celebrante de costas para o povo. Isto porque o altar sempre era construído em direção ao Oriente (ad Orientem), do sol nascente, representando que Cristo é o Sol da Justiça (cf. Ml. 3, 20) e a Luz da verdade (cf. Jo. 8, 12), e é para Ele que os fiéis se voltam durante a Liturgia. Se o celebrante dava as costas para os fiéis, era no intuito de ele também se voltar na direção do leste. E quando no altar está fixado o Tabernáculo, tal postura também serve para que ele fique de frente para Deus (versus Deum), conservado sacramentalmente no Sacrário. Mesmo nas igrejas cujo altar principal não tem Sacrário, e nem foram construídas na direção do leste (caso das basílicas romanas), o celebrante continua “voltado para Deus” porque reza diante do crucifixo posto sobre o altar, símbolo do Santo Sacrifício da Missa.
Atualmente, a Igreja autorizou a postura do celebrante “de frente” para o povo (versus populum), para que os fiéis vejam o que se passa no altar. No entanto, esta postura não substituiu o costume antiquíssimo de se rezar a Missa “de frente” para Deus. Autoridades da Igreja e estudiosos de Liturgia comentam que rezar a Missa de frente para o povo dá a entender que o centro da celebração são os fiéis. Este pensamento tem levado diversas celebrações a se desviarem do seu sentido sagrado, tornando-se um mero festejo popular.
No Rito Gregoriano a Santa Missa sempre é celebrada de costas para o povo, ao passo que, no Rito novo, permite-se o uso das duas posturas. Afinal, o Rito novo é o resultado de uma reforma litúrgica, que mudou e diminuiu as orações da Liturgia romana, a fim de facilitar a participação dos fiéis, mas isto não significa que a tradição da Igreja deva ser eliminada e extirpada dele. Deste modo, o Rito novo pode ser celebrado em latim e de costas para o povo. O que mudou da "Missa antiga" para a "nova" é o Rito, e não a arte de celebrar (ars celebrandi).
13 - Qual a relação entre a música e a Liturgia?
A Liturgia é o culto oficial da Igreja, na qual o homem por inteiro se dirige a Deus. É porque a criatura deve uma submissão total ao Criador que a Liturgia oferece um culto integral a Deus, em que o corpo e a alma têm a sua justa participação. Para tanto, a Igreja sempre adornou o culto litúrgico de ricas cerimônias, porque não basta louvar a Deus apenas com a alma, mas também pelo corpo, usando de símbolos, ritos e gestos que expressam e manifestam os atos da Religião, e assim obrigam a natureza por inteiro do homem a participar do culto divino. Neste sentido, grande utilidade tem o canto para a oração da Igreja, o qual não é apenas um acompanhamento, mas parte integrante da Liturgia. Assim tinha ensinado o Papa São Pio X no documento “Tra le solicitudine”, quando afirma que, na Liturgia, a música sacra “participa do seu fim geral, que é a glória de Deus e a santificação dos fiéis, [pois] concorre para aumentar o decoro e esplendor das sagradas cerimônias; e, assim como o seu ofício principal é revestir de adequadas melodias o texto litúrgico proposto à consideração dos fiéis, assim o seu fim próprio é acrescentar mais eficácia ao mesmo texto, a fim de que por tal meio se excitem mais facilmente os fiéis à piedade e se preparem melhor para receber os frutos da graça, próprios da celebração dos sagrados mistérios.
E justamente porque a música sacra é parte integrante da Liturgia, de modo a colaborar na glorificação de Deus e santificação dos fiéis que ela deve possuir as qualidades próprias da Liturgia, isto é, nomeadamente, a música sacra deve ser: 1) santa, excluindo todo o mundano, 2) arte verdadeira, imprimindo eficazmente na alma dos fiéis os desejos e intenções pelas quais se celebra a Liturgia, 3) universal, ou seja, uma arte que possa sempre ser reconhecida em todas as épocas e lugares como música apropriada para o culto litúrgico.
Por estas razões, nem toda a música é cabível na Liturgia. É necessário que possua uma melodia adequada, de modo que disponha a alma para o culto e desperte sentimentos de contrição, adoração, humildade, etc. Neste sentido, o Rito Romano desde muitos séculos emprega o canto gregoriano como seu canto oficial. Com efeito, o gregoriano é definido como “a palavra cantada”, porque sua melodia se desenvolve em torno das salmodias e orações da Igreja, sendo canto litúrgico por natureza. Não há canto mais sublime, harmonioso e perfeito para o culto divino do que o gregoriano, e por isso mesmo vivamente difundido pelos Papas.
Na Reforma Litúrgica, a Igreja reconheceu a superioridade do canto gregoriano, mas deu também maior espaço para cânticos religiosos populares, que já eram usados desde muitos séculos. Há de se notar que a aprovação dada pela Igreja não atinge todo o tipo de canto religioso. O cântico popular deve ser coerente com a Liturgia, mantendo a sacralidade, solenidade e sobriedade. Neste sentido, o interesse da Reforma Litúrgica era aprovar os hinos e salmodias católicos existentes na época, mas jamais tolerar as músicas disseminadas hoje na Liturgia, de inspiração protestante, seja na letra, em contradição com a fé, ou na melodia, impregnada de sentimentalismo e romantismo.
Com relação aos instrumentos, somente a partir de alguns séculos é que eles se disseminaram, pois o canto litúrgico—seja o canto gregoriano no Ocidente ou o canto bizantino no Oriente—foi geralmente executado sem acompanhamento instrumental. Para as celebrações de Rito Romano, a Igreja prescreve o órgão como o instrumento mais adequado. Entretanto, em tempos de penitência, os instrumentos silenciam.
Atualmente, para as celebrações no Rito reformado da Missa, introduziu-se o abusivo costume de permitir instrumentos mundanos, como bateria, guitarra, sanfona, piano, etc. Estes instrumentos não se adequam à sublimidade da Liturgia, pois são próprios para a música profana. A Igreja os proíbe desde a instrução “Tra le solicitudine”, do Papa São Pio X. A música, para que participe da Liturgia, deve ser sacra, isto é, separada de tudo o que é mundano. Do contrário, a celebração se torna apenas um festejo comunitário, e não o culto a Deus.

Nenhum comentário:

Postar um comentário